Durante a noite, o principezinho levantou-se da cama. Caminhava pela casa vazia e às vezes cismava frente às janelas que tinha deixado abertas. todos os dias era o mesmo. Deixava tudo aberto porque se sentia abandonado. Era uma grande casa em ruínas. como uma criança, erguia os olhos ao céu e nessa noite ouvia lá fora o pranto dos campos. Debaixo da sua pele chorava a sua mãe. Sentada no sofá com todo o seu corpo a tremer. todo o seu corpo a chorar. não era só o rosto, ou os olhos. mas os braços. o abdómen, o tórax, cada braço e cada perna. todos choravam num coração pesado. nessa noite o principezinho olhou pela janela fora com os olhos muito abertos e todo ele era uma escuridão enorme por não saber onde terminava aqueles frutos tão nocturnos da vida. a casa chorava, sentia. toda aquela janela chorava frente à noite. toda aquela casa envelhecia durante o tempo. aquela casa. lembro-me de pensar como aquele telhado de duas águas se abraçava tocando-se ao de leve apenas no topo. dentro de si, o principezinho estava em silêncio. trazia em si aquele choro das uvas que apenas pendem para a terra na vinha. aquele mesmo choro dos presentes nunca oferecidos, daqueles presentes para sempre esquecidos. para sempre ausentes no amor. o principezinho repetia para consigo mesmo: «um dia morrerei», e voltava a repetir, «tudo isto que eu vejo é transitório, todo este nada que eu sou é absolutamente transitório». e com este dito inclinava-se cada vez mais para o silêncio como os vértices daquela casa, como cada vértice daquela janela sangrenta, fechada na prisão da melancolia e no coração cada vez mais cansado daquelas ruínas que dormiam sofrimento dentro.
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