sexta-feira, dezembro 30, 2005


Lembro-me de perder tudo. Por onde quer que andasse eu deixava tudo o que era meu em todo o lado. Lembro-me de como a minha mãe me doía. por mim. por eu esquecer tudo quanto era meu em todo o lugar. deixei aquela caneta naquele café, mãe. deixei a mochila dentro da sala. perdi dois casacos. perdi tanta coisa e tu doías-me por dentro ao me dizeres que eu não podia ser assim. que um homem não pode ser assim. hoje, se me ponho a pensar nisto, vejo que não perco nada há muito tempo. há anos. há anos em viagem. que não perco nada. não perco nada, mãe, porque ao deixar de me esquecer das coisas esqueci-me de mim. fechado dentro daquela sala. naquela caneta. que agora não perco, por não haver eu. por haver um homem. um homem que é por dentro uma memória que nunca esquece.