segunda-feira, junho 25, 2007



Posso ir na corrente desta grande cidade, diluído no cimento e no silêncio da multidão, mas por dentro trago em mim os meus lugares de paz como uma flor invisível. Falo para mim mesmo no caminho para casa. Digo esta imagem quase oculta e táctil na luz deste fim de tarde. Pouco me importa sequer se existo: que diferença faria numa imagem uma espécie de felicidade acrescentada? Desço as alamedas e entretanto alguém me empurra como uma mancha indecente. Posso ir nesta corrente de gente sem fundo e sem motivo mas magoa-me qualquer coisa aqui. Sempre que me magoaram ao longo da vida nunca senti, por exemplo, que alguma pessoa o tivesse feito contra mim. Reparei talvez tarde e com um misto de espanto e de tristeza que muitas pessoas remetiam sempre para um outro a causa da sua dor: as pessoas são pontos de unidade a partir das quais emergem determinações que interferem connosco. Mas eu nunca tinha pensado assim. Vou na corrente desta grande cidade e não sei o que sou, misturado no cimento e silêncio da multidão. Pouco me importa. Desço a alameda. Trago em mim as imagens e ninguém me empurra. Pouco me importa se existo.