Era uma vergonha do que é gratuito. Com aquele Professor aprendi também que não existe para mim outra forma possível de eu ser senão esta: aberto e dado ao cuidado de tudo o que se me dá na forma diária da ternura. Lembrei-me de si naquele dia. Naquela noite em que me telefonaram para o telemóvel quando por acaso estava à beira de entrar no cinema para ver um filme tonto. estou com contracções de cinco em cinco minutos, dizias. eu menti-te naquele dia. sabes? menti-te porque era o mais nobre a fazer. e fui ter contigo para te levar à maternidade porque para mim é um orgulho fazer parte da tua história, da nossa história, deste tempo, deste mundo e deste Universo com todas as suas dores. Lembro-me de pensar no meu Professor de Ética no caminho escuro pela estrada fora para ir ter contigo com os quatro piscas ligados. é urgente cuidar, pensava. lembro-me de por milagre tudo ter corrido bem. lembro-me de pensado que naquele dia tinha nascido outra mãe. que tinha nascido outro filho. que tinha nascido outra história dentro de uma história já tão longa como o universo. que tudo nasce dentro dentro de tudo. e que a tua barriga era uma metáfora da gravidez de toda esta recapitulação tão primitiva. Este Universo que se enamora de si mesmo, pensei. É tão belo. Este Universo que se volteia em pedaços de amor e se dispersa e desagrega em redes sistemáticas de vida e de pequenos destroços de morte ainda assim na mesma corrente do fenómeno vida. Lembro-me daquilo que o Professor disse naquela aula; que tinha sido a vida a inventar a morte e não o contrário. Lembro-me de ter dado as boas vindas ao António Lourenço e de ter visto as duas avós dele muito contentes. De ter visto um pai nascer naquela noite. De ter visto aquele hospital como um imenso ser vivo e de eu próprio ter recuado dentro da minha cabeça aos tempos em que andava pela Faculdade onde havia uma grande árvore plantada no seu centro.
domingo, dezembro 21, 2008
Era uma vergonha do que é gratuito. Com aquele Professor aprendi também que não existe para mim outra forma possível de eu ser senão esta: aberto e dado ao cuidado de tudo o que se me dá na forma diária da ternura. Lembrei-me de si naquele dia. Naquela noite em que me telefonaram para o telemóvel quando por acaso estava à beira de entrar no cinema para ver um filme tonto. estou com contracções de cinco em cinco minutos, dizias. eu menti-te naquele dia. sabes? menti-te porque era o mais nobre a fazer. e fui ter contigo para te levar à maternidade porque para mim é um orgulho fazer parte da tua história, da nossa história, deste tempo, deste mundo e deste Universo com todas as suas dores. Lembro-me de pensar no meu Professor de Ética no caminho escuro pela estrada fora para ir ter contigo com os quatro piscas ligados. é urgente cuidar, pensava. lembro-me de por milagre tudo ter corrido bem. lembro-me de pensado que naquele dia tinha nascido outra mãe. que tinha nascido outro filho. que tinha nascido outra história dentro de uma história já tão longa como o universo. que tudo nasce dentro dentro de tudo. e que a tua barriga era uma metáfora da gravidez de toda esta recapitulação tão primitiva. Este Universo que se enamora de si mesmo, pensei. É tão belo. Este Universo que se volteia em pedaços de amor e se dispersa e desagrega em redes sistemáticas de vida e de pequenos destroços de morte ainda assim na mesma corrente do fenómeno vida. Lembro-me daquilo que o Professor disse naquela aula; que tinha sido a vida a inventar a morte e não o contrário. Lembro-me de ter dado as boas vindas ao António Lourenço e de ter visto as duas avós dele muito contentes. De ter visto um pai nascer naquela noite. De ter visto aquele hospital como um imenso ser vivo e de eu próprio ter recuado dentro da minha cabeça aos tempos em que andava pela Faculdade onde havia uma grande árvore plantada no seu centro.
<< Home